Boas resoluções parecem ser de curta duração. Enquanto a Volkswagen se apresentava como campeã da solução elétrica após o caso Dieselgate, está agora a rever a sua estratégia e decidiu realocar parte significativa de seus investimentos em motores térmicos.
Depois de muitos meses, o carro elétrico já não está no centro das atenções. Apresentado como a única solução para o transporte individual livre de carbono, o carro a bateria enfrenta agora problemas com uma queda drástica nas vendas. Esta situação está a minar os fabricantes de automóveis – excepto os chineses que são subsidiados e têm perfeito controlo sobre os seus custos – que fizeram investimentos colossais em investigação e desenvolvimento, mas também em ferramentas industriais.
A desaceleração nas vendas mostra como é difícil impor o modelo de carro elétrico aos condutores. E isto tem explicação! Muitos países não apoiam a transição, o que torna este tipo de automóveis simplesmente inacessíveis para a grande maioria.

Sumário do conteúdo
Veja Também …
O Retorno dos Motores a Combustão?
Neste contexto, muitos fabricantes estão a regredir. Vimos isso na Mercedes, que desistiu de eliminar a energia térmica em 2030, ou na Renault, que prometeu construir híbridos plug-in até o último momento, atualmente até 2035.
Neste contexto, muitos fabricantes pedem, se não um retorno, pelo menos uma extensão do motor térmico para além de 2035, muito simplesmente porque 100% eléctrico não parece viável nem na realidade dos consumidores nem económico para os consumidores industriais. Ainda mais significativo: muitas marcas não aguardam o sinal das autoridades para mudar de estratégia e voltar ao motor térmico. Isto é demonstrado em particular por marcas japonesas como Honda, Toyota e Mazda, que anunciam uma nova geração de motores capazes de funcionar com uma variedade de combustíveis isentos de carbono.
Na Volkswagen também!
A última reviravolta até agora é a da Volkswagen que acaba de renunciar algures à sua estratégia eléctrica iniciada após o Dieselgate em 2015. O grupo decidiu de facto travar a fundo no carro a bateria e realocar um terço dos 180 mil milhões de euros de desenvolvimentos planeados para o… motor térmico.
A sua decisão foi tomada, naturalmente, devido à recepção agora mista dos carros eléctricos por parte do público e mostra como a transição será muito mais lenta do que o esperado. A Volkswagen estimou que a quota de carros eléctricos vendidos seria de 80% em 2030, mas as perspectivas agora não são tão certas. E nós entendemos. Nos primeiros quatro meses de 2024, as vendas do ID.4 caíram -31%, as do ID.3 -41%, as do Cupra Born -12% e as do Enyaq -2,3% . Apenas a Audi consegue manter o e-tron do quarto trimestre (+0,6%).
Trata-se, portanto, agora de manter a competitividade dos motores térmicos e continuar a desenvolver tecnologias eléctricas, mas com menos vigor. E mais rentabilidade. A decisão é oficial uma vez que foi anunciada por Arno Antlitz, diretor financeiro e COO da Volkswagen à Automotive News Europe e põe completamente em causa o compromisso anteriormente assumido pelo grupo de abandonar o motor térmico em 2033.
O resto do grupo VW está a proceder da mesma forma. Porsche, Bugatti e Lamborghini estão agora também a explorar alternativas aos combustíveis fósseis, particularmente com combustíveis sintéticos. A Bugatti está até a considerar postos de gasolina domésticos para esses novos tipos de combustível – quando o cliente puder pagar, é claro.
Porque, sim, os motores térmicos continuam a fascinar e a ser desejados pelo público que por isso não quer desfazer-se deles. Ou quando o mercado força o marketing e, talvez em breve, também os políticos. A história contínua…
As raízes da mudança
A mudança de estratégia da Volkswagen pode ser atribuída a diversos fatores interligados. A pandemia da COVID-19 e a guerra na Ucrânia causaram instabilidade nos mercados globais, elevando os preços de commodities e materiais essenciais para a produção de veículos elétricos. A crise energética europeia também contribuiu para a incerteza, com o disparar dos custos de eletricidade a dificultar a adoção em massa de carros elétricos.
Além disso, a Volkswagen enfrenta desafios técnicos e logísticos na produção de veículos elétricos em larga escala. A escassez de baterias e a infraestrutura de recarga ainda incipiente em muitos países representam obstáculos significativos. A empresa também enfrenta críticas pela sua dependência de fornecedores externos de baterias, principalmente da China.
Reinvestindo no motor a combustão
Diante destes desafios, a Volkswagen está a redirecionar os seus investimentos para o desenvolvimento de motores a combustão mais eficientes e menos poluentes. A empresa investirá em tecnologias como a hibridização leve e a eletrificação parcial, que combinam motores a combustão com motores elétricos para reduzir o consumo de combustível e as emissões.
A Volkswagen também intensificará seus esforços na produção de biocombustíveis, como etanol e biodiesel, que podem ser usados em motores a combustão tradicionais para reduzir o impacto ambiental. A empresa acredita que os biocombustíveis podem ser uma ponte importante para a mobilidade sustentável, enquanto os desafios da eletrificação completa ainda persistem.
As implicações da mudança
A mudança de estratégia da Volkswagen tem implicações significativas para a indústria automóvel e para o futuro da mobilidade. A empresa, que antes era vista como líder na corrida à eletrificação, agora parece estar a adotar uma abordagem mais cautelosa e pragmática.
Esta mudança pode ter um impacto negativo na adoção de veículos elétricos em todo o mundo, pois a Volkswagen é um dos maiores fabricantes de automóveis e sua decisão pode influenciar outras empresas a seguir o mesmo caminho. No entanto, a Volkswagen também pode estar simplesmente sendo realista ao reconhecer os desafios da eletrificação completa e procurando soluções alternativas para reduzir as emissões de carbono.
O futuro da mobilidade
O futuro da mobilidade ainda é incerto e dependerá de diversos fatores, como o desenvolvimento de novas tecnologias, a evolução dos preços de energia e as políticas governamentais. A Volkswagen, como um dos principais players da indústria automóvel, terá um papel crucial na definição desse futuro.
A empresa precisa de encontrar um equilíbrio entre o desenvolvimento de veículos elétricos e a manutenção de uma produção viável de motores a combustão. A Volkswagen também precisa investir em pesquisa e desenvolvimento para encontrar soluções inovadoras para a mobilidade sustentável, que sejam acessíveis e adaptáveis às diferentes realidades dos mercados globais.

Reações e Repercussões: A Mudança da Volkswagen gera ondas na indústria
A decisão da Volkswagen de desacelerar o projeto elétrico e reinvestir no motor a combustão não passou despercebida. A mudança estratégica do gigante automóvel gerou uma onda de reações e repercussões por parte de analistas, ambientalistas, concorrentes e, claro, os próprios consumidores. Vamos dissecar algumas dessas reações:
Analistas do Mercado:
- Divisão de Opiniões: Analistas do mercado financeiro dividem-se nas suas opiniões sobre a decisão da Volkswagen. Alguns consideram a mudança como uma jogada estratégica acertada, baseada em realismo diante dos desafios atuais. Outros temem que isso possa atrasar a transição para a mobilidade elétrica e prejudicar a competitividade da empresa a longo prazo.
- Pressão dos Investimentos ESG: Investidores com foco em critérios ambientais, sociais e de governança (ESG) podem pressionar a Volkswagen a reconsiderar sua estratégia. Afinal, a eletrificação é vista como um fator crucial para a sustentabilidade e o combate às alterações climáticas.
Ambientalistas e Ativistas:
- Preocupação com o Meio Ambiente: Ambientalistas e ativistas expressam uma profunda preocupação com a mudança de rumo da Volkswagen. Eles temem que o foco renovado no motor a combustão possa retardar os esforços de redução de emissões e impactar negativamente o meio ambiente.
- Cobrança de Alternativas Sustentáveis: Os ambientalistas podem cobrar da Volkswagen o desenvolvimento de soluções paralelas, como o investimento em biocombustíveis de segunda geração e o incentivo ao uso de energias renováveis para recarregar veículos elétricos.
Concorrentes do Setor Automóvel:
- Corrida pela Liderança Elétrica: A decisão da Volkswagen pode abrir brechas para que concorrentes, como Tesla, BYD e empresas chinesas, solidifiquem sua liderança no mercado de veículos elétricos.
- Reavaliação de Estratégias: A mudança da Volkswagen pode levar outros fabricantes a reavaliarem suas próprias estratégias de eletrificação. É possível que haja um movimento de desaceleração generalizado, mas também pode surgir uma corrida para dominar o nicho dos motores a combustão mais limpos.
Consumidores:
- Incerteza na Compra: Consumidores que planeavam migrar para veículos elétricos podem ficar em compasso de espera diante da mudança da Volkswagen. A incerteza sobre o futuro da tecnologia e o receio de desvalorização dos carros a combustão podem afetar o mercado.
- Demanda por Opções Híbridas: A aposta da Volkswagen em tecnologias híbridas pode atrair consumidores que buscam uma transição gradual para a mobilidade elétrica, sem abrir mão totalmente do motor a combustão que já conhecem.

Portugal em Foco: Impactos Locais da Mudança
A decisão da Volkswagen tem implicações diretas para Portugal, um país com forte presença da indústria automóvel. Vamos analisar alguns dos impactos potenciais:
- Investimentos nas Fábricas Portuguesas: A aposta em motores a combustão mais limpos pode representar oportunidades de investimento nas fábricas portuguesas da Volkswagen, como a Autoeuropa em Palmela. A linha de produção pode ser adaptada para fabricar veículos com essas novas tecnologias.
- Empregos na Indústria: O foco renovado no motor a combustão pode garantir empregos no setor automóvel português, pelo menos a curto e médio prazo. No entanto, a longo prazo, a qualificação da mão de obra para a produção de veículos elétricos será fundamental para a competitividade do setor.
- Transição Energética em Portugal: O investimento em biocombustíveis pode impulsionar a produção nacional desses recursos, contribuindo para a independência energética do país. No entanto, é crucial garantir a sustentabilidade do processo de produção dos biocombustíveis para evitar impactos negativos no meio ambiente.
- Incentivos Governamentais: O governo português pode desempenhar um papel crucial para mitigar os efeitos negativos da mudança de estratégia da Volkswagen. O incentivo à compra de veículos elétricos e o investimento em infraestrutura de carregamento continuam a ser fundamentais para a transição energética do país.

Inovação e Sustentabilidade: O Caminho para o Futuro
Apesar da desaceleração no projeto elétrico, a Volkswagen ainda tem a oportunidade de ser líder em mobilidade sustentável. A empresa precisa focar-se na inovação e encontrar soluções que conciliem eficiência energética, redução de emissões e acessibilidade para o consumidor. Aqui estão alguns caminhos possíveis:
- Desenvolvimento de Baterias Mais Eficientes: A Volkswagen pode investir em pesquisa e desenvolvimento para baixar o custo de produção das baterias e aumentar a sua autonomia. Baterias com maior alcance e menor tempo de carregamento tornariam os veículos elétricos mais atrativos para o consumidor.
- Motores Elétricos Mais Potentes: O investimento em motores elétricos mais potentes e leves pode melhorar o desempenho dos veículos elétricos, tornando-os mais competitivos em relação aos carros a combustão,principalmente no que diz respeito à aceleração e velocidade final.
- Economia Circular na Produção: A adoção de práticas de economia circular na produção de veículos pode reduzir o impacto ambiental da indústria automóvel. A reutilização de materiais e a reciclagem de baterias são aspectos fundamentais para uma cadeia produtiva mais sustentável.
- Investimentos em Hidrogénio Verde: A Volkswagen pode explorar o potencial do hidrogénio verde como fonte de energia limpa para veículos elétricos. O hidrogénio produzido a partir de fontes renováveis pode ser uma alternativa viável às baterias tradicionais, com a vantagem do reabastecimento rápido similar aos veículos a combustão.
- Mobilidade como Serviço (MaaS): A Volkswagen pode investir em soluções de mobilidade como serviço (MaaS), que oferecem acesso a diferentes meios de transporte através de uma única plataforma. O MaaS pode incentivar o uso compartilhado de veículos elétricos e reduzir a dependência do transporte individual.
Conclusão: Um Futuro com Mutiplas Estradas
A decisão da Volkswagen de desacelerar o projeto elétrico e reinvestir no motor a combustão representa uma mudança significativa no panorama da indústria automobilística. No entanto, essa mudança não significa necessariamente o fim da eletrificação. É mais provável que vejamos um futuro com múltiplas estradas para a mobilidade sustentável.
Os motores a combustão mais limpos, os biocombustíveis sustentáveis e os veículos híbridos podem desempenhar um papel importante na transição energética, desde que sejam implementados com responsabilidade ambiental. No entanto,a eletrificação completa continua sendo o objetivo final para alcançar a neutralidade carbónica.
A Volkswagen, como uma das maiores fabricantes de automóveis do mundo, tem a responsabilidade de liderar o caminho para um futuro sustentável. A empresa precisa de investir em inovação, adotar práticas ambientamente corretas e oferecer soluções acessíveis ao consumidor. O sucesso da transição energética na indústria automobilística dependerá da capacidade da Volkswagen e de outros fabricantes de se adaptarem às mudanças, abraçarem a inovação e colocarem a sustentabilidade no centro das suas estratégias.
No final, o consumidor terá um papel crucial na definição do futuro da mobilidade. A procura por veículos elétricos e a pressão por soluções sustentáveis por parte dos consumidores irão ditar os rumos da indústria. A educação do consumidor sobre os benefícios da eletrificação e o incentivo à adoção dessa tecnologia serão fundamentais para acelerar a transição para uma mobilidade mais limpa.